Crônica - Vão-se os dedos - Parte III




O baile foi um tremendo sucesso entediante, horas a fio de conversas chatas, assuntos vazios e companhias dispensáveis. Músicas, danças, bebidas, comidas e Ferdinand Parker, o melhor partido da região, galante, educado e entediante. Não largou a presença de Nathicana em minuto algum e ajudou bastante para o insucesso da noite. A bela doutora já não agüentava mais fingir ser uma banal rica e solteirona senhorita.

A vida pedia mais, podia mais e deveria ser mais que vestidos, festas e assuntos desnecessários, a jovem ansiava por uma existência mais significativa e passou a festa toda pensando nas descobertas que seus amigos haviam-lhe relatado e, logicamente, com o sumiço dos pesquisadores.

Senhorita Nath voltou para casa pouco depois do término da contagem da passagem de ano, já havia cumprido seu papel social e então estava na hora de voltar para uma boa noite revigorante de sono, mas isso não foi possível. Algumas horas após começar a dormir, Nath acorda assustada com batidas fortes à porta. Do outro lado, a voz histérica de Ester a chama incessantemente, “Senhorita Nathicana, acorde, é uma emergência”.

Nath acorda e se move rapidamente, empurrando os lençóis e cobertas para o lado e buscando um roupão que lhe cobrisse a camisola. Ester deve ter um bom motivo para acordá-la desta maneira, no meio da madrugada. Seus passos vão ligeiros até a porta e a senhorita abre o quarto, vendo em sua frente a imagem gorda da governanta mal coberta com um lençol, acompanhada por uma figura que se revela de súbito na escuridão do corredor.

- Senhorita, este é Mark, o caseiro da fazenda dos Lancaster, nossos visinhos. Aconteceu algo horrível.

Nathicana pergunta o que havia ocorrido para que fosse acordada de súbito e Mark explicou em poucas palavras:

- Eu sabia que a senhora era médica e eu trouxe isso.

Mark estendeu para a moça um pacote que segurava, disse ainda, em meio a lágrimas silenciosas, que seu irmão Lucas e seu filho Carl haviam sumido na noite do dia 30. Enquanto explicava, o senhor estendeu o braço e começou a desembrulhar o pacote feito de panos sujos e encardidos, banhados no que parecia ser sangue, e continuava a falar “... nessa madrugada, minha esposa e eu ouvimos gritos e eu peguei a espingarda para ver o que era e só encontrei isso.”

Ester virou seu rosto marcado pelo choro, por já saber o que era e Nathicana viu o conteúdo do pacote, uma mão, direita de um homem adulto, decepada e suja de barro e sangue e em um dos dedos, um anel.

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