[CAP] Capítulo UM - O Lord do casebre (parte 2)

Zurk tenta prestar mais atenção, indo até a porta e tentando ouvir de maneira mais clara os sons que de fora vinham e por alguns instantes chegou a desconfiar da presença de seu "algoz", porém, o som não demonstrava alguém em plenas condições de caçar outro, pelo contrário, parecia uma presença debilitada. Mesmo assim, e por dúvida, o feiticeiro sacou seu sabre e o empunhou, abrindo então a porta segura pelo vento e neve. A folha se abriu com força e violência, e o chão logo se encobre de neve. O vento frio invade a casa e balança as vestimentas de Zurk. Ele observa uma pessoa caída, a alguns metros de seu casebre, com face enterrada na neve e vestes parcas. Aparentemente, um homem, provavelmente novo e magro, cabelos escuros, curtos e pele clara. O desconhecido não mais emitia sons, gemidos ou fazia algum movimento.

O feiticeiro se aproximou com cautela e guardou seu sabre e avistou o sujeito, que aparentemente, não oferecia perigo, se aproximou e verificou se ele estava vivo. Virando o corpo, revelou-se a face do moribundo. Era uma figura realmente jovem, com não mais de duas décadas de vida. Os olhos fechados e a respiração fraca indicavam o estado grave da situação... fome? frio? A quanto tempo ele estaria sem aquecimento na neve? Os pés descalços revelavam uma pele muito lisa e limpa para
alguém da lida, mas um nobre não estaria em tal situação, não assim, à sorte.

Com um pouco de dificuldades, Zurk leva o rapaz para a cabana, protegendo-o do frio em sua cama, cobrindo o moribundo com seu cobertor quente. O feiticeiro arma um fogareiro e aquece água para imergir os pés do pobre para aquecê-lo e logo depois prepara um chá. Mesmo com tentativas esporádicas, ele só consegue acordar o rapaz depois de algumas horas. A friagem se manifesta na pele queimada de frio e no nariz vermelho e os olhos opacos causavam estranheza para o feiticeiro. Não havia ainda visto olhos "sem vida"... tentou por algumas vezes entrar em contato, mas o menino tremia, soluçava, espirrava e as vezes delirava, balbuciava coisas incompreensíveis e gemia.

Zurk buscou na mente qualquer feição semelhante à do moço, mas parecia-lhe que seu semblante era único. Nada havia em seus trajes, nenhum objeto, nenhuma identificação. Seu corpo, aparentemente não apresentava nenhuma marca, a não ser em sua mão, como uma cicatriz circular, de uma polegada de diâmetro, na palma esquerda. O estranho era que arremetia a outra marca, nas costas da mão, com menor raio, com se algo tivesse atravessado a palma, mas nada tão espesso permitiria cicatrização como esta. Outra coisa de se espantar era o estado que o menino estava, com a chibata do vento e o frio do chão, se este moribundo vagasse o suficiente para cair de cansaço e exaustão, sua condição seria muito pior. Algo mais causara danos a ele, mas não seria possível descobrir nesta situação, então, restava tratá-lo do frio e buscar mais mantimentos, mas isso implicaria em ter um hóspede desconhecido em sua casa por pelo menos dois meses. A não ser que outro alguém o hospedasse como boa vontade, mas isso seria muito difícil, o feiticeiro, apesar de conhecido, não possuía amigos e sua presença na cidade montava um cenário que misturava mistério, curiosidade e medo. O mais sensato seria aguardar até o rapaz acordar e depois fazer as indagações.


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Ei Zurk, olha só... olha o que Drails fez com o gato! - Aldis apontava para o gato e Drails ria em pé ao lado do bicho morto com um pedaço de pau na mão. Zurk olhou para o animal e olhou suas entranhas para fora e olhos saltados e crânio amassado e disse "matar gato preto traz má sorte".


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O feiticeiro da cabana acorda com um vento frio e batidas ritmadas da porta ao sabor da ventania. A força do ar arrombou a entrada da cabana e trouxe a neve para dentro, obrigando Zurk a levantar e travar a porta com a cadeira, o único móvel além da cama. Aproveita para comer algo e mastiga sem vontade, somente para manter o ritual básico da sobrevivência enquanto observa pensativo o rapaz, que volta a ter tonalidade humana na pele e a dar sinais de tranqüilidade. Depois de dois dias à base de chás forçados com pães dissolvidos, o moribundo acorda e observa assustado o ambiente escuro do casebre.

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